PICADEIRO DAS EMOÇÕES

 

Sou Cleide Canton, nascida em Assis, interior-oeste do Estado de São Paulo, divorciada, professora e bacharela em Direito, Auditora Fiscal aposentada, mãe de três filhos, pretensa escritora e poetisa, dedicada aos versos desde a infância.  Sou resultado de uma fusão de estilos, de linguajar simples e acessível aos leitores, voltada para o existencial, dramas do cotidiano e problemas sociais. Amante dos sonetos, também me dedico a versos brancos, desde que consiga neles uma harmonia melódica. Gosto da solidão para escrever, do cheiro de mato com chuva, das manhãs e das madrugadas. Defendo valores esquecidos, a civilidade e o patriotismo. Estudo o ser humano, principalmente adolescentes e idosos, embora tenha me dedicado exclusivamente às crianças por mais de vinte anos. Sou amante inveterada da vida e da natureza e ainda acredito num mundo de paz para os homens. Trabalhos publicados em jornais locais, revistas universitárias, associações, duas Antologias, um poema declamado por Rolando Boldrin na TV Cultura e um site: www.paginapoeticadecleidecanton.com

 SINTO VERGONHA DE MIM

Cleide Canton

Sinto vergonha de mim
por ter sido educador de parte desse povo,
por ter batalhado sempre pela justiça,
por compactuar com a honestidade,
por primar pela verdade
e por ver este povo já chamado varonil
enveredar pelo caminho da desonra.

Sinto vergonha de mim
por ter feito parte de uma era
que lutou pela democracia,
pela liberdade de ser
e ter que entregar aos meus filhos,
simples e abominavelmente,
a derrota das virtudes pelos vícios,
a ausência da sensatez
no julgamento da verdade,
a negligência com a família,
célula-mater da sociedade,
a demasiada preocupação
com o "eu" feliz a qualquer custo,
buscando a tal "felicidade"
em caminhos eivados de desrespeito
para com o seu próximo.

Tenho vergonha de mim
pela passividade em ouvir,
sem despejar meu verbo,
a tantas desculpas ditadas
pelo orgulho e vaidade,
a tanta falta de humildade
para reconhecer um erro cometido,
a tantos "floreios" para justificar
atos criminosos,
a tanta relutância
em esquecer a antiga posição
de sempre "contestar",
voltar atrás
e mudar o futuro.

Tenho vergonha de mim
pois faço parte de um povo que não reconheço,
enveredando por caminhos
que não quero percorrer...

Tenho vergonha da minha impotência,
da minha falta de garra,
das minhas desilusões
e do meu cansaço.
Não tenho para onde ir
pois amo este meu chão,
vibro ao ouvir meu Hino
e jamais usei a minha Bandeira
para enxugar o meu suor
ou enrolar meu corpo
na pecaminosa manifestação de nacionalidade.

Ao lado da vergonha de mim,
tenho tanta pena de ti,
povo brasileiro!


***

"De tanto ver triunfar as nulidades,
de tanto ver prosperar a desonra,
de tanto ver crescer a injustiça,
de tanto ver agigantarem-se os poderes
nas mãos dos maus,
o homem chega a desanimar da virtude,
a rir-se da honra,
a ter vergonha de ser honesto".

(Rui Barbosa)

 Quero viver assim
Cleide Canton

Quero viver assim,
como se tudo fora madrugada
e que o silêncio reinasse
enquanto as luzes
permanecessem acesas
e as velas não estivessem
apagadas nas mesas.

Quero viver assim,
tocando os sonhos despertos.
cobrindo de oásis os meus desertos
vivendo só e na solidão contigo.

Quero viver assim,
na ânsia da beleza incontida,
na pureza de sentimentos,
na certeza do caminho,
na paz que protege o meu ninho,
na verdade em que acredito,
no alcance do meu infinito...

Quero viver assim,
sorrindo das bênçãos que recebo,
compartilhando o seu desassossego,
acarinhando o amor que prego
e recebendo aquele que não nego.

Quero viver assim,
sentindo parte do tudo em mim,
beijando a brisa
que a seus lábios me leva,
brincando com as estrelas
que deliciam o seu olhar.

Quero viver assim
na intensidade deste momento único
em que me desnudo de tudo
que não seja verdadeiro,
em que me entrego inteira,
sem medos e preconceitos,
senhora de mim.

SP, 30/05/2004
20:30 minutos

 

Anjos

Se crês ou não,

anjos cantarão para ti,

se quiseres.

Cantar-te-ão

ao som de harpas celestiais

e esquecerás jamais.

Farão

brotar em teu coração

a paz, a serenidade,

a alegria e a felicidade.

Anjos

farão florescer

as sementes da pureza

que, com toda a certeza,

alguém de ti roubou.

Devolver-te-ão a esperança esquecida,

que no teu peito um dia teve guarida.

Não te assustes ao escutá-los

Saiba entendê-los e louvá-los.

Deixa apenas uma fresta

no teu eu entristecido

pela dor endurecido.

Será o bastante!

Eles te ensinarão a viver

na plenitude do teu ser.

Aprenderás

a admirar as árvores dos teus caminhos

e os pássaros que nelas fazem seus ninhos.

Aprenderás

a entender todas as emoções

sem discutir as razões.

Verás

que a vida é a maior das venturas

e que és a melhor das criaturas.

Hoje

divido contigo

todos os anjos que cantam na minha janela

Sê feliz!

Cleide Canton Garcia

 

Alguma coisa acontece

Alguma coisa acontece...
Talvez aquele apelo em forma de prece
que o tempo não conseguiu desgastar.
Talvez aquela ânsia de beleza
que mesmo nos momentos de tristeza
o peito se negou a apagar.

Alguma coisa acontece...
Num olhar que se cruza e não se esquece
deixando o pranto secar.
Talvez a danada saudade
num ímpeto de boa vontade
tenha feito morada em outro lugar.

Alguma coisa acontece...
Outra visão de amor aparece
no parêntesis da nova poesia.
Confrontam-se medo e coragem
no palco da velha miragem
esquecida no âmago da melancolia.

Alguma coisa acontece
no silêncio do mundo quando anoitece
fazendo brotar de novo a esperança.
E no deleite desse tolo momento
deixo vagar meu pensamento
e te encontro na mesma dança.